João Maria
Foi em 1997 que João Maria decidiu mudar-se para Londres onde passados dois anos, já estava a receber convites para os seus primeiros “gigs”. Ficou por lá até 2003, ano que decide voltar a Portugal. Desde então, já partilhou a cabine com artistas e produtores como Zip, Ricardo Villalobos, Raresh, Matthias Tanzmann, Guillaume & The Coutu Dumonts, Dorian Paic, Vera, Daze Maxim, Jan Krueger entre outros. Toca regularmente em clubs como o LUX, o Pitch, o Gare e o Brownie (onde tem uma residência mensal). Mais recentemente, a convite da editora “Hello?Repeat” tocou no “Salon - Zur wilden Renate” em Berlin.
Desde
2007, que é responsável pela programação do palco electrónico de dois
dos maiores festivais nacionais, o festival "Sudoeste TMN e o Festival
Super Bock Super Rock, organizados pela “Musica no Coração”.
João
Maria é hoje em dia um dos grandes responsáveis por “labels” como a
Perlon, a Hello?Repeat ou a [a:rpia:r], serem conhecidas em Portugal.
João
Maria tem seu cargo dois programas de rádio: o “Assemble Radio” na
Rádio Oxigénio (Sextas depois da meia noite, Lisboa 102.6, www.oxigenio.fm) e “Casa Branca” na Rádio SWTMN (de Segunda a Sexta, da meia noite às duas) e em 2010 lançou a produtora “Dogtown”.
Para
2012, os planos incidem na label “Assemble Music” (vinyl only), que
fundou em conjunto com Miguel Neto, e que já está prevista a segunda
edição para Maio deste ano. Desta vez a cargo de Daze Maxim
(Hello?Repeat / Story / Cocoon).
Entrevista a João Maria
Como começou a tua carreira como dj?
Em
1997 fui viver para Londres e comecei a frequentar os clubes da altura.
A partir dai comecei a ter a necessidade de procurar os temas que ouvia
nos clubes e corria as lojas todas de vinil que conheci nessa altura, a
Black Market, a Vinyl Junkies, a Rough Trade e outras. Só bem mais
tarde é que apareceu a Phonica, que hoje em dia é também uma referência.
Mais tarde comprei uns pratos manhosos e uma mixer e ai começou tudo.
Quais os artistas que mais influenciaram a tua escolha musical nos dias de hoje?
As
minhas influências passam por artistas como o Moodymann, Ricardo
Villalobos, Carl Craig, Kenny Larkin, Norm Talley, Boo Williams, Mike
Huckaby, Daniel Bell, Zip, Gemini, Delano Smith, Thomas Melchior,
Losoul, os meus amigos de Berlim e Frankfurt, o Daze Maxim, Dorian Paic ,
a Vera, o Jan Krueger e muitos outros. Gosto muito do que se fazia nos
anos 90 e passo a vida na internet a procurar discos. Ao mesmo tempo
acho que hoje em dia há muita coisa nova bastante boa. Gosto bastante do
trabalho dos Romenos apesar de achar um disparate o facto de qualquer
disco deles que sai agora, passado umas semanas de estar esgotado já só
se encontram os discos no discogs a valores completamente absurdos.
Alguns discos deles são muito bons mas há muitos discos tão bons ou
melhores a 1,5€ no discogs. Gosto também muito do trabalho do Bruno
Pronsato, do Áudio Werner, do Petre Inspirescu, do Fumiya Tanaka, da
Margaret Dygas, Maayan Nidam, Cabanne, Portable, San Proper e outros.
Qual o momento ou momentos que mais te marcaram nestes anos ligados á musica?
As
melhores experiências forma mesmo mais recentemente. O ter fechado o
festival SBSR 2011 depois do Ricardo Villalobos foi um momento incrível.
Estava um ambiente e uma energia fora do normal! As 2 ultimas festas em
que toquei em Berlim também foram do melhor! Uma foi na noite da
editora Hello?Repeat e outra foi numa festa do próprio clube, o Salon
Zur Wilden Renate. E claro sem dúvida o dia em que a Assemble Music pôs o
primeiro Ep à venda!
Vivemos
hoje, um tempo repleto de oportunidades no que toca á musica
eletrónica, ou achas que o espaço que existe para novos valores
nacionais é um pouco reduzido?
O
espaço que existe é quase zero, e o pouco que há não vai fazer nada de
especial pelos artistas. É um circuito muito pequeno e que nos dá
algumas alegrias e boas festas, mas para quem quer seguir carreira como
Dj e produtor tem que ter a cabeça lá fora, para o estrangeiro. Conheci
(virtualmente) à pouco tempo um artista do Porto, o Bruno Deodato, que
assina como Trikk. É um miúdo novo que está a fazer boa musica, com pés e
cabeça, e foi tentar a sorte para Londres. Neste momento faz parte da
agência onde está também o Carl Craig e já editou na Man Make Music ao
lado de nomes como o George Fitzgeral e na label Portuguesa “Container
Music”. Se tiver cabeça vai longe. Claro que não basta só ir lá para
fora, é preciso ser-se bom! E essa é a diferença entre Portugal e
algumas cidades como Londres e Berlim. Lá se fores bom, alguém há-de
reparar em ti e mais tarde ou mais cedo as coisas começam a rolar. Aqui
podes ser um talento a vida toda e ninguém dá por isso. Ou então dizem
aquela frase do costume.. “está muito à frente para o povo Português..”
?? Juro que nunca entendi esta frase. Eu olho à minha volta e sinto que
muitos artistas portugueses querem apenas andar neste circuito que não
passa do mesmo todas as semanas e sentem-se preenchidos com isso. Estão
no direito deles, mas se realmente queres ser bom e reconhecido tens que
pensar diferente. Eu tenho um grande respeito pelo que se passou em
Portugal nos anos 90. Foi a melhor época a nível de música e festas.
Fala-se que o circuito está a melhorar em Portugal, eu acho que não
está. De momento o Lux e o Gare, na minha opinião, são os clubes que
fazem programação séria e arriscam com internacionais e nacionais o ano
inteiro. Depois claro há várias tentativas por parte de outros clubes e
promotores de trazerem outros nomes e arriscarem, mas só acontece de vez
em quando. Infelizmente hoje em dia já não chega só comprar discos para
arranjar gigs, tem que haver uma marca à volta do Dj, ou pertences a um
clube com nome, ou tens uma editora, ou fazes umas festas que se tornam
conhecidas e te promoves através desse nome ou te dedicas à produção a
serio e tentas entrar nas editoras boas. Por outro lado, o facto de o
mercado estar assim, tem feito com que os artistas trabalhem mais, para
que mais coisas interessantes aconteçam em Portugal. Até ao fim de 2012
vão estar ativas várias labels Portuguesas a editarem vinil, como a
Assemble Music, a Pluie Noir, Xquisite, Sonic Culture, One Eyed Jacks,
Príncipe, Groovement, Bloop, Hands Of Time, Unless, 30porumalinha e
possivelmente outras que não me estou a lembrar de momento.
Fala-nos um pouco da Assemble Music. O seu conceito, onde quer chegar, a quem quer chegar e projetos futuros.
A
Assemble Music nasce pelo facto de eu ser consumidor de vinil e de
querer trabalhar neste meio durante muito mais tempo. Se um dia já não
tocar, tenho a editora para continuar ligado ao meio. Sou viciado neste
mundo e nada me dá mais gozo do que pensar que a qualquer momento posso
receber temas incríveis para um Ep, de produtores novos ou de grandes
referências, como é o caso do Daze Maxim. Em relação a este projecto
não podíamos (eu e o Miguel Neto) estar mais contentes. A editora é
vinyl only e fazemos apenas 300 copias. Trabalhamos com DNP (Diamonds
and Pearls) como distribuidora e eles fazem um trabalho incrível! Os
discos são vendidos em lojas no Japão, USA, e em todas as lojas
conhecidas na Europa. O Primeiro Ep é de um grande amigo nosso, O Dorian
Paic da Cocoon, com uma remistura da Maayan Nidam (Ex Miss Fitz). O
disco foi muito bem aceite e está practicamente esgotado em todas as
lojas. Em Maio sai já o segundo EP, com 2 temas originais do Daze Maxim
(Hello?Repeat, Story, Cocoon). Acho que este vai correr mesmo muito bem,
os temas são incríveis! Já estamos a trabalhar o 3º e 4º EP e vem ai
muito boas noticias!!
Qual o artista português que mais aprecias no momento?
Tenho
um amigo, o André Cascais, que me mostrou e ensinou muita coisa quando
vivíamos os dois em Londres. Ele conhecia tudo e foi uma época
importante para mim. Neste momento ele também vive em Lisboa, e tem a
sua residência mensal com o Vargas no Lux. Para dar outros exemplos
quero falar do Vahagn, que tem sido uma agradável surpresa como produtor
neste ultimo ano. Esta semana saiu uma compilação do Dj Harvey em que
aparece um tema do Vahagn que saiu pela Groovement. Há também outro
membro da Groovement, o Jorge Caiado, que editou temas na Balance
Alliance do Chez Damier e na Secret Sundaze do Giles Smith. O Cleymoore
da Pluie Noir que é um miúdo cheio de talento! O Trikk, os Photonz, o
Tiago e outros.
O que pensas da constante repetição de artistas estrangeiros no nosso país?
Achas que é um processo natural das coisas, ou achas que é uma estratégia de negócio?
Achas que é um processo natural das coisas, ou achas que é uma estratégia de negócio?
É
normal, como disse à pouco, o circuito é muito pequeno e quando queres
andar por outros meios mais comerciais para ganhar dinheiro, torna-se
perigoso arriscar em nomes novos, o que faz com que seja mais do mesmo.
Eu tento contrariar isso por exemplo, quando faço as festas Dogtown com a
Bárbara Noronha. Tento trazer sempre artistas novos ou que venham cá
poucas vezes. A ultima foi no Lux, fizemos a Get Perlonized, festa que
acontece todos os meses no Panorama Bar em Berlim. Tocou o Zip e o Sammy
Dee. As festas têm corrido bem mas é sempre um risco. Ainda assim acho
que temos que fazer aquilo em que acreditamos. As pessoas não são
obrigadas a conhecer tudo, têm é que ir para as festas de cabeça aberta
para consumir musica diferente. Eu não gosto de sair por sair. Gosto de
ouvir boa musica e de ser surpreendido pela escolha musical de quem
está atrás da cabine. Um bom Dj tem que ter personalidade, arriscar e
ser criativo nos sets que faz, se não, a única diferença entre ouvir
esse Dj e 90% dos outros igual a ele, é que possivelmente um mistura
melhor que o outro.
Se tivesses que escolher um artista para dividir a cabine qual escolherias?
Zip.
Já tocámos juntos e correu bem! A selecção musical e a maneira como ele
leva o set é exatamente aquilo que me faz ter uma boa noite de musica.
Esteja quem estiver a tocar antes dele, ele começa sempre do inicio e
conta a sua historia. Vale a pena!